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16 de ago. de 2011

O argumento de Russell


     Ainda sobre epistemologia, minha mente ferve. Russell, em seu livro "Os problemas da filosofia" original de 1912 inicia o capítulo 13 com a seguinte questão: "Podemos conhecer algo, com efeito, ou só de vez em quando por uma feliz coincidência, acreditarmos que é verdadeiro?" (RUSSELL, 2005).
     Até agora entendemos por conhecimento as proposições justificadas sob a luz da epistemologia (independente de corrente) (DUTRA, 2010), entretanto, Gettier (1963) afirma, ou nos desafia, que mesmo assim não há garantias de encontrarmos a verdade, jogando uma grande pá de terra em cima do que tínhamos como realidade, a partir da lógica epistemológica. Preciso de uma terceira voz, alguém para desempatar o jogo, pois até então ambos argumentos parecem razoáveis, embora sejam conflitantes.
    Entendamos novamente o significado da palavra conhecimento. Uma crença justificada não é necessariamente um conhecimento (RUSSELL, 2005). Algumas crenças, mesmo verdadeiras, não são conhecimento, pois, para Russell (2005) fica claro que uma crença verdadeira não é um conhecimento quando é deduzida de uma crença falsa. Mesmo que (e principalmente quando) o sujeito acredite que a crença falsa, é verdadeira... Argumento de Russell (2005) e também de Gettier (1963). Ele até agora só fala o que não é, mas não fala o que é... já to vendo tudo, meus miolos vão fritar.
    Ainda sobre o que não é conhecimento. Um erro de lógica, é conhecido como falacia. Nessas situações conhecimento nenhum será gerado, mesmo que as premissas sejam verdadeiras, por falha na lógica. Por exemplo:
   Se sei que todos os gregos são homens e que Sócrates era homem, e infiro que Sócrates era grego, não se pode dizer que sei que Sócrates era grego, porque, embora as premissas e a conclusão sejam verdadeiras, a conclusão não se segue das premissas.

     Então para que haja conhecimento as premissas devem ser verdadeiras, a lógica deve estar correta e as premissas também devem ser conhecidas. Para Russell (2005) então, o conhecimento é o que é validamente deduzido de premissas conhecidas. Mas como o sujeito conhece as premissas é onde mora o problema. Bem lembremos que Dutra (2010) excluí essa responsabilidade do campo da epistemologia, tratando somente o conhecimento derivado.
     O conhecimento derivado é aquele que é deduzido de forma válida de premissas conhecidas intuitivamente. Ou seja, não nos importemos de onde vieram as crenças, mas se estas foram justificáveis, e a lógica dedutiva estiver correta, atingiremos o conhecimento (derivado).
     Fácil? Vou complicar mais. Um sujeito pode conceber uma crença verdadeira intuitivamente a qual pode ser inferida de modo válido, mas a partir do qual não foi, de fato, inferido por um método lógico (RUSSELL, 2005).
    Todo nosso problema gira em torno do conhecimento intuitivo. Para o conhecimento derivado sempre será possível recair sobre o conhecimento intuitivo. Quando assumimos crenças e deduções, nosso erro será perdoado se deixarmos nos enganar pelo conhecimento intuitivo, sempre pela desculpa da incapacidade de saber que ele estava errado. Para Gettier (1963) essa desculpa é de amarelo e o problema está realmente no método dedutivo, enquanto Russell (2005) coloca um parenteses nas crenças, chama de conhecimento indutivo, aprova o método dedutivo, e fica com um abacaxi na mão.
    O abacaxi é o conhecimento intuitivo que é constituído pela crença e pela percepção (no sentido simples mesmo). Em relação a todo fato então existem duas formas de assumirmos conhecimento: (1) por meio de um juízo, no qual se julga que suas diversas partes relacionam-se; e (2) por meio do conhecimento direto do próprio fato complexo, o qual pode ser denominado de percepção. A primeira nos dá uma garantia parcial da verdade enquanto a segundo uma garantia total. A secunda exige a ocorrência real do fato não tenta discutir realidade agora que já tenho problemas demais, já a primeira... talvez não.
    Slow down! Deixa eu entender uma coisa. Gettier (1963) disse que a dedução era uma coisa errada por gênese e não sugere nada, mas eis que Russell (2005), sugere que o problema não é na dedução como um todo, mas apenas naquelas onde as crenças são obtidas por meio de juízo (qualquer coisa que não o empirismo). Olha que legal, parece que a escola empirista não precisa de mais nada para se justificar. Vamos ver como Russell (2005) resolve então a questão das crenças de juízo.
    Imagine um grau de certeza em relação aos conhecimentos intuitivos. Chamemos de muita certeza algo que você percebe com seus sentidos e é tangível o suficiente para não lhe causar nenhum princípio de dúvida, e chamemos de pouca certeza uma crença que é duvidoso. Se, nesta escala, o sujeito possui certeza, o fato foi observado pelos sentidos e não resta dúvida, temos um conhecimento. Se o sujeito tem certeza de que não pode afirmar se o fato foi observado ou não, chamemos de erro. Mas se em algum grau há uma dúvida sobre a realidade do fato, com base em inferência lógica ou psicológica, temos a opinião provável. (RUSSELL, 2005).
    "Um corpo de opiniões individualmente prováveis, se são mutuamente coerentes, tornam-se mais prováveis do que seria cada uma individualmente. É desta maneira que muitas hipóteses adquirem sua probabilidade. Elas se organizam num sistema coerente de opiniões prováveis, e, assim, tornam-se mais prováveis do que o seriam isoladamente" (RUSSELL, 2005).
    Está então resolvido o problema, ufa. Conhecimento é uma crença justificada sob lógica dedutiva baseado em premissas verdadeiras, verificáveis e reais. Quando das premissas não se pode afirmar sua veracidade (realidade), chama-se opiniões prováveis. Com forme mais pessoas apostam em uma mesma opinião provável, maior a probabilidade desta se tornar conhecimento. E como nós sabemos que a epistemologia não observa as premissas, apenas a justificação (DUTRA, 2010), ela se livra de um questionamento desqualificante e por esta saída intelectual genial de Russell (2005) ao problema de Gettier (1963), podemos continuar nossa aventura no mundo da epistemologia, agora mais bem mais forte.

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